quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A Herança dos Gregos

A HERANÇA DOS GREGOS

Sabendo-se que o organismo animal é um universo dinâmico pelo trabalho constante das células e dos órgãos, que o cérebro é um desconhecido, e que o coração é, enquanto vivemos, um maltratado e perpétuo escravo da ignorância do seu dono, eis algumas considerações sobre saúde, exercício, trabalho e lazer.
Os gregos, além da sua filosofia, nos legaram uma porção de ensinamentos e o exemplo dos exercícios integrais do corpo, da mente e do espírito; e da auto-preservação, porque se nutriam basicamente de mel, óleos vegetais, frutas, sucos e cereais. Em geral não tinham doenças, e se as tivessem, eles mesmos se tratavam. Em que pese a acusação dos pósteros de que eram promíscuos e não tomavam banho (sozinhos), naquele tempo não havia doenças incuráveis, e o câncer não passava dum instrumento da natureza do organismo para aspirar toxinas e alertar aos seus portadores de que deviam se desintoxicar e moderar-se; assim, um tumor não era visto ou considerado como um inimigo, não precisava ser extirpado, lancetado, bombardeado com raios ou combatido quimicamente com antibióticos, mas deixado estar para que cumprisse sua função como órgão adventício e temporário. Cada indivíduo era, com a recomendação de Hipócrates, seu próprio médico e guardião, baseado em conhecimentos terapêuticos e preventivos adquiridos através de uma educação saudável e multidisciplinar, preocupada com o bem-estar comum, a começar pela máxima do “conhece-te a ti mesmo” e pelo estudo (aproveitável) das artes liberais e de todas as ciências.
Seus exercícios eram feitos ao ar livre, sem nenhum tipo de aparelho ou instrumento, a não ser no caso de que fossem guerreiros ou atletas que se deviam adestrar com lanças, fundas, dardos, pesos e discos. Mas no geral todos iniciavam por leves exercícios respiratórios, de relaxamento e de distensão do diafragma muscular, e a seguir, do livre movimento das articulações, braços e pernas. Também corriam, com ou sem obstáculos. Foram os precursores da Maratona.
Mas o simples exercício diário de andar (caminhar), após o indispensável alongamento das pernas e dos pés, era recomendado a todas as idades, mesmo durante os estudos, como era o caso dos peripatéticos, em que o mestre Aristóteles e seus discípulos literalmente perambulavam em aula.
Hoje, em casa ou em seu local de trabalho, qualquer pessoa sem parecer ridícula pode e deve se exercitar; ou até mesmo enquanto aguarda ociosamente a sua vez na fila de um banco ou repartição, ou sentada na sala de espera de um consultório médico ou ambulatório. Aliás, ambulatório significa ‘mover-se de um lado para outro’.
Por outro lado, se quisermos unir em exercício simultâneo o inexorável ao aproveitável, enquanto lavamos ou passamos roupa, descascamos batatas, escolhemos feijão, cozinhamos ou lavamos a louça, em vez de ficarmos aborrecidos, contrariados, praguejando ou ruminando idéias fixas, podemos colocar os pensamentos em ordem, refletir, idealizar projetos realizáveis e compensatórios, segundo aquilo que nos é inerente.
Assim absorvidos não sentiremos o tempo passar e concluiremos essas tarefas domésticas, aparentemente “não lucrativas”, felizes e satisfeitos. Isso é o que se chama de lazer. (Este artigo, agora reduzido em seu tamanho, foi originalmente publicado na íntegra com o título “Saúde, Exercício, Trabalho e Lazer” no Jornal A Cidade, de Santana do Livramento - RS, em 31 de julho de 1999 - Luciano Machado - o autor.)