quarta-feira, 25 de junho de 2014

SINUHE, O EGÍPCIO …

Uma bela maneira de aprendermos a gostar do estudo de certas disciplinas, como a história por exemplo, é a leitura de autores que não abordam os fatos com rigorismo científico, mas antes lhes dão um sabor de romance ou aventura.  Entre eles estão Alan Poe, H.G.Wells, Júlio Verne, Mika Waltari e o nosso Malba Tahan

Infelizmente, nos dias de hoje, os nossos jovens não se interessam  por esses autores, nem os conhecem, mas foram eles que conduziram nossos pais e avós a enveredarem pelo caminho do conhecimento.

Quando eu tinha uns dezoito ou dezenove anos, emprestaram-me o romance O Egípcio, de Mika Waltari.

Nesse livro o autor narra a vida e as aventuras de Sinuhe, filho adotivo de um médico, o qual, tendo herdado de seu pai a vocação pela medicina, não soube se manter dentro dos padrões de comportamento e disciplina e tornou-se um aventureiro.

Como filho de um médico, Sinuhe quis seguir a mesma atividade  do pai.  E assim foi iniciado na escola onde se ministravam os ensinamentos e mistérios da ciência sacerdotal. 

O local onde esses conhecimentos eram ensinados, no palácio real, se chamava “Casa da Vida”, uma espécie de universidade onde se aprendiam, entre outras, a ciência e a arte da medicina.  A Casa da Vida se situava num pavimento superior do palácio real, enquanto a Casa da Morte, onde se embalsamavam os cadáveres, funcionava nos subterrâneos.

Embora tenha se tornado um sacerdote médico, depois da morte de seu pai Sinuhe deixou-se atrair amorosamente pela babilônica sacerdotisa de Set (o deus gato dos egípcios) cujos aposentos na corte passou a freqüentar.

Esta mulher perversa, que representava o vício da luxúria e da dissipação, largou Sinuhe literalmente ‘de tanga’, depois de lhe tirar o dinheiro e adonar-se de seus bens.

Arruinado, depois de um estágio de castigo entre os necrófilos da Casa da Morte, por seu desregramento moral e por não aceitar o culto a um deus representado por um animal, Sinuhe saiu a peregrinar pelo deserto.

Mas em sua peregrinação, ao passar pelo Vale dos Reis, onde ficam as pirâmides, foi assaltado e capturado por ladrões.

Porém, como nada possuía para ser roubado, foi acolhido pelos ladrões e convidado a participar do seu sindicato, pois os ladrões naquele tempo já eram organizados.

Recusando o convite para ficar, Sinueh foi liberado pelos ladrões, que ainda lhe deram duas moedas de ouro.  Com uma dessas moedas Sinueh, pelo caminho, comprou e libertou um escravo e deu-lhe a outra moeda de presente.  E sozinho continuou a sua peregrinação.

Depois de vaguear pela vastidão do deserto, quase morto de fome, de sede e de cansaço, deparou-se com uma grande muralha que se erguia e estendia à sua frente e que surgira de repente, numa espécie de oásis, em pleno deserto.

Sinuhe golpeou num dos portões e um guarda veio dizer-lhe que ali não podia entrar nenhum forasteiro, mesmo porque a filha do rei estava muito enferma.  Sinuhe então lhe disse que era médico e o rei mandou franquear-lhe  o ingresso.

Ao entrar, Sinueh deparou-se com algo tão espantoso que, a princípio, quase não acreditou.  Diante de seus olhos apresentava-se um mundo fabuloso, com belíssimas paisagens.  Era um oásis, por uma admirável obra de engenharia circunscrito no deserto, com sua natureza, lagos, flora, fauna, palácios e magníficos jardins.

Ali, depois de ser recebido pelo rei e sua corte, e de curar a jovem princesa, Sinuhe passou a viver.

Durante um banquete que se seguiu em sua homenagem, o rei ofereceu-lhe a mão de sua filha; mas nesse instante,  ao contemplar uma roda de moinho que alguns escravos amarrados a ela faziam girar, perguntou ao rei porque mantinha aqueles escravos amarrados, numa atitude tão cruel que contrastava com a beleza do lugar.

O rei, para convencê-lo de que era um soberano justo e misericordioso, disse que aqueles escravos ali estavam amarrados desde crianças, e que não conheciam a beleza do lugar porque, para evitar que se angustiassem, lhes tinha mandado furar os olhos ...

Desiludido e revoltado com tamanha crueldade, Sinuhe despediu-se e continuou a peregrinar.  E conheceu outros lugares, suas culturas e seus costumes.

Num anacronismo propositado, Mika Waltari coloca Sinueh em contato com povos de outros tempos; faz com que visite a Grécia,  a ilha de Creta e observe os hábitos sociais do Palácio do Rei Minos, e que conviva com os hititas, assírios e caldeus, aprendendo-lhes as artes e as ciências.

Passados muitos anos, Sinuhe retorna, materialmente pobre, porém rico em conhecimentos e experiência de vida.

Ao chegar, encontra no lugar de sua antiga casa paterna um suntuoso palácio, cujo proprietário era ninguém menos do que o escravo que havia libertado e que, durante a sua ausência, habilmente investira aquela moeda de ouro na compra e estocagem de cevada que, previamente soubera, iria escassear, devido a uma longa estiagem, em conseqüência do  refluxo das vazantes do rio Nilo ...

Ao parabenizar o escravo por seu espírito empreendedor, este lhe diz:

-- Obrigado, meu amo.  Mas isto lhe pertence.  Toda esta riqueza e patrimônio eu construí para o senhor.

Sinueh aceitou aqueles bens, mas voltando a freqüentar a casa da sacerdotisa, tornou a arruinar-se até o último centavo ...

E mais duas vezes tornou a peregrinar, recompondo-lhe o escravo novamente a fortuna e sendo esta impiedosamente dilapidada por Sinuhe ...

Derradeiramente empobrecido, Sinueh é convidado pelo faraó Amenófis IV, que fora seu amigo de infância e agora instituíra no Egito o culto monoteísta, para ser o médico real e seu médico particular.

No exercício de suas funções como médico do palácio real, Sinuhe vem a curar de lepra uma mulher do povo,  e em cujo semblante envelhecido reconhece aquela que por três vezes o arruinara, a sacerdotiza de Seth. 

Esta é mais ou menos em resumo a história de Sinuhe, o Egípcio, que li há mais de 40 anos,  cuja leitura ainda hoje recomendo, pois, apesar de ser uma ficção, ela foi escrita em cima de fatos da história e há nela todo um manancial de informações e aprendizado sobre a cultura e a ciência dos povos antigos.

Luciano Machado




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