SINUHE, O EGÍPCIO …
Uma bela
maneira de aprendermos a gostar do estudo de certas disciplinas, como a história por exemplo, é a leitura de
autores que não abordam os fatos com rigorismo científico, mas antes lhes dão
um sabor de romance ou aventura. Entre
eles estão Alan Poe, H.G.Wells, Júlio Verne, Mika Waltari e o nosso Malba Tahan
Infelizmente,
nos dias de hoje, os nossos jovens não se interessam por esses autores, nem os conhecem, mas foram
eles que conduziram nossos pais e avós a enveredarem pelo caminho do
conhecimento.
Quando eu
tinha uns dezoito ou dezenove anos, emprestaram-me o romance O Egípcio, de Mika
Waltari.
Nesse livro
o autor narra a vida e as aventuras de Sinuhe, filho adotivo de um médico, o
qual, tendo herdado de seu pai a vocação pela medicina, não soube se manter
dentro dos padrões de comportamento e disciplina e tornou-se um aventureiro.
Como filho
de um médico, Sinuhe quis seguir a mesma atividade do pai.
E assim foi iniciado na escola onde se ministravam os ensinamentos e mistérios
da ciência sacerdotal.
O local
onde esses conhecimentos eram ensinados, no palácio real, se chamava “Casa da
Vida”, uma espécie de universidade onde se aprendiam, entre outras, a ciência e
a arte da medicina. A Casa da Vida se
situava num pavimento superior do palácio real, enquanto a Casa da Morte, onde
se embalsamavam os cadáveres, funcionava nos subterrâneos.
Embora
tenha se tornado um sacerdote médico, depois da morte de seu pai Sinuhe
deixou-se atrair amorosamente pela babilônica sacerdotisa de Set (o deus gato
dos egípcios) cujos aposentos na corte passou a freqüentar.
Esta mulher
perversa, que representava o vício da luxúria e da dissipação, largou Sinuhe
literalmente ‘de tanga’, depois de lhe tirar o dinheiro e adonar-se de seus
bens.
Arruinado,
depois de um estágio de castigo entre os necrófilos da Casa da Morte, por seu
desregramento moral e por não aceitar o culto a um deus representado por um
animal, Sinuhe saiu a peregrinar pelo deserto.
Mas em sua
peregrinação, ao passar pelo Vale dos Reis, onde ficam as pirâmides, foi
assaltado e capturado por ladrões.
Porém, como
nada possuía para ser roubado, foi acolhido pelos ladrões e convidado a
participar do seu sindicato, pois os ladrões naquele tempo já eram organizados.
Recusando o
convite para ficar, Sinueh foi liberado pelos ladrões, que ainda lhe deram duas
moedas de ouro. Com uma dessas moedas
Sinueh, pelo caminho, comprou e libertou um escravo e deu-lhe a outra moeda de
presente. E sozinho continuou a sua
peregrinação.
Depois de
vaguear pela vastidão do deserto, quase morto de fome, de sede e de cansaço,
deparou-se com uma grande muralha que se erguia e estendia à sua frente e que
surgira de repente, numa espécie de oásis, em pleno deserto.
Sinuhe
golpeou num dos portões e um guarda veio dizer-lhe que ali não podia entrar
nenhum forasteiro, mesmo porque a filha do rei estava muito enferma. Sinuhe então lhe disse que era médico e o rei
mandou franquear-lhe o ingresso.
Ao entrar,
Sinueh deparou-se com algo tão espantoso que, a princípio, quase não acreditou. Diante de seus olhos apresentava-se um mundo fabuloso,
com belíssimas paisagens. Era um oásis,
por uma admirável obra de engenharia circunscrito no deserto, com sua natureza,
lagos, flora, fauna, palácios e magníficos jardins.
Ali, depois
de ser recebido pelo rei e sua corte, e de curar a jovem princesa, Sinuhe
passou a viver.
Durante um
banquete que se seguiu em sua homenagem, o rei ofereceu-lhe a mão de sua filha;
mas nesse instante, ao contemplar uma
roda de moinho que alguns escravos amarrados a ela faziam girar, perguntou ao
rei porque mantinha aqueles escravos amarrados, numa atitude tão cruel que
contrastava com a beleza do lugar.
O rei, para
convencê-lo de que era um soberano justo e misericordioso, disse que aqueles
escravos ali estavam amarrados desde crianças, e que não conheciam a beleza do
lugar porque, para evitar que se angustiassem, lhes tinha mandado furar os
olhos ...
Desiludido
e revoltado com tamanha crueldade, Sinuhe despediu-se e continuou a
peregrinar. E conheceu outros lugares,
suas culturas e seus costumes.
Num
anacronismo propositado, Mika Waltari coloca Sinueh em contato com povos de
outros tempos; faz com que visite a Grécia, a ilha de Creta e observe os hábitos sociais
do Palácio do Rei Minos, e que conviva com os hititas, assírios e caldeus,
aprendendo-lhes as artes e as ciências.
Passados
muitos anos, Sinuhe retorna, materialmente pobre, porém rico em conhecimentos e
experiência de vida.
Ao chegar,
encontra no lugar de sua antiga casa paterna um suntuoso palácio, cujo
proprietário era ninguém menos do que o escravo que havia libertado e que,
durante a sua ausência, habilmente investira aquela moeda de ouro na compra e
estocagem de cevada que, previamente soubera, iria escassear, devido a uma
longa estiagem, em conseqüência do
refluxo das vazantes do rio Nilo ...
Ao
parabenizar o escravo por seu espírito empreendedor, este lhe diz:
--
Obrigado, meu amo. Mas isto lhe
pertence. Toda esta riqueza e patrimônio
eu construí para o senhor.
Sinueh
aceitou aqueles bens, mas voltando a freqüentar a casa da sacerdotisa, tornou a
arruinar-se até o último centavo ...
E mais duas
vezes tornou a peregrinar, recompondo-lhe o escravo novamente a fortuna e sendo
esta impiedosamente dilapidada por Sinuhe ...
Derradeiramente
empobrecido, Sinueh é convidado pelo faraó Amenófis IV, que fora seu amigo de
infância e agora instituíra no Egito o culto monoteísta, para ser o médico real
e seu médico particular.
No
exercício de suas funções como médico do palácio real, Sinuhe vem a curar de lepra
uma mulher do povo, e em cujo semblante
envelhecido reconhece aquela que por três vezes o arruinara, a sacerdotiza de
Seth.
Esta é mais
ou menos em resumo a história de Sinuhe, o Egípcio, que li há mais de 40 anos, cuja leitura ainda hoje recomendo, pois,
apesar de ser uma ficção, ela foi escrita em cima de fatos da história e há nela
todo um manancial de informações e aprendizado sobre a cultura e a ciência dos
povos antigos.
Luciano
Machado
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